O governo federal demorou para agir, ficou acompanhando, de forma negligente, o que ocorria, especialmente na China e na Itália. Ante a inércia deste, os estados se viram obrigados a tomar a dianteira no enfrentamento da pandemia, logo após a OMS (Organização Mundial da Saúde), órgão da ONU e integrado por inúmeros países, por isso, multilateral, declarar o corona vírus uma pandemia mundial.
Os estados, através de seus governadores, seguiram a orientação da OMS e dos infectologistas, ou seja, determinaram o isolamento social por meio da quarentena das pessoas que não desempenham serviços essenciais, isto é, a cadeia da alimentação, os setores da saúde, segurança, combustíveis, gás, água e luz.
Assim agiram governadores de diferentes partidos políticos e correntes políticas. Foi assim com os estados de todas as regiões do país. Alguns até quiseram reabrir o comércio, mas voltaram atrás na decisão após consultar os profissionais da saúde e da ciência.
Ao contrário destes, o chefe do executivo federal inicialmente negou a gravidade da pandemia e a classificou como uma gripezinha, depois brigou com vários governadores, a quem atribuiu a tentativa de quebrar a economia do país, como se estes fossem os responsáveis pela pandemia e quisessem inviabilizar seus próprios governos.
O pior de tudo é que muitos fizeram coro com o presidente da república e duvidaram da gravidade da situação e condenaram o fechamento da maior parte do comércio e da indústria. Em Goiás, não foi diferente. As entidades empresariais apoiaram o presidente e condenaram o governador. Ouve até algumas carreatas espalhadas pelo país pedindo a reabertura de tudo e já!
Finalmente, o presidente tomou a primeira medida concreta: fechou a fronteira com a Venezuela. Ora, porque com a Venezuela? Esta não tinha focos da pandemia, mas foi fechada assim mesmo, por razões nada racionais, mas sim, puramente ideológicas. Como é sabido, o presidente não reconhece o governo venezuelano. Note-se que o presidente, quando em campanha – e as vezes acho que ainda não saiu dela -, criticava o governo anterior por agir apenas ideologicamente. Não sei em que se difere do anterior, neste aspecto.
Em compensação, mantinha a entrada livre e sem qualquer controle de passageiros procedentes até mesmo da infectada China e dos EUA, além dos países europeus, enquanto muitos outros países já haviam fechado suas fronteiras.
Mais tarde fechou as fronteiras com nossos vizinhos da América do Sul, dos quais já mantinha um certo distanciamento, a exceção do Chile, a pouco convulsionado, mas ainda mantinha os aeroportos recebendo chineses, americanos e europeus. Ao invés de buscar harmonia e coesão com os governadores, como exige o momento, brigava com estes e os acusava de desejarem o caos para o Brasil. Continuava negando a gravidade e destoando, por completo, de seu próprio ministro da saúde e do sensato vice-presidente.
Depois de muitos panelaços por todo o país contra a postura do presidente e bem depois do seu grande ídolo, Donald Trump, adotar as mesmas medidas que os governadores brasileiros adotaram, ameaçou uma mudança de discurso ao reconhecer a gravidade da crise em pronunciamento de rádio e TV.
Contudo, seu histórico recente não recomenda esperarmos por uma sequência lógica em seu discurso. Prova disso, é que no dia seguinte, como se desmentindo-se a si próprio, voltou a criticar os governadores e a semear a discórdia e a desunião. Tudo que o momento não exige, muito pelo contrário, o que precisamos é de sensatez, equilíbrio, calma e união nacional contra o inimigo comum.
A única certeza que temos é a de que não teremos nada disso que se espera e o momento clama. O que temos é falta de materiais básicos de proteção dos profissionais de saúde e a mais completa carência de exames do coronavírus, isto sem falar na ausência de políticas públicas eficazes e rápidas para amainar a grave crise que assola o país e ameaça seus cidadãos e a economia.
O presidente poderia seguir o exemplo de seus colegas europeus e até de seu ídolo maior, seu congênere americano. No entanto, propôs apenas 200 reais para os trabalhadores informais, que o Congresso prudentemente triplicou e outras tênues medidas, muitas por serem implementadas e sem data, embora a necessidade de pessoas e empresas seja para ontem.
Enfim, parece que o timoneiro sumiu, ou se recusa a comandar a nau. Esperamos não nos transformar em um novo Titanic!
Os tempos são outros, mas guardam semelhanças com aqueles da viagem do também presidente, João Goulart, à China comunista. Sim a China, de novo ela, o Brasil mudou, mas nem tanto. A China continua comunista.
Fernando Aurvalle Krebs é promotor de justiça e mestre em Direito